Foto: Reprodução/Agência Brasil
Por Nicola Pamplona / Rio de Janeiro, RJ
O anúncio de distribuição de dividendos recordes pela Petrobras agradou o mercado, mas gerou questionamentos sobre a estratégia da empresa, que reduziu investimentos e vem priorizando usar seu caixa para remunerar os acionistas, entre eles o governo.
Em teleconferência para detalhar o lucro de R$ 54,3 bilhões no segundo semestre de 2022, a direção da empresa defendeu que a distribuição de R$ 87,8 bilhões em dividendos não prejudica a saúde financeira da companhia. E adiantou que novos valores devem ser pagos este ano.
Com os dividendos do segundo trimestre, a Petrobras terá distribuído R$ 136,3 bilhões pelo desempenho no primeiro semestre de 2022. Precisando de dinheiro para bancar auxílios emergenciais e renúncias fiscais, o governo fica com quase R$ 40 bilhões.
Os valores do segundo trimestre estão “significativamente acima das expectativas do mercado”, nas palavras dos analistas Bruno Amorim, João Frizo e Guilherme Costa Martins, do banco Goldman Sachs. As ações da estatal reagiram forte alta na Bolsa.
O analista Daniel Cobucci, do BB Investimentos, porém, alerta para riscos dessa política de prioridade à remuneração aos acionistas gerar “implicações para o crescimento e atuação estratégica para o longo prazo”.
Esse movimento, diz, ocorre em meio a um processo de venda de ativos e redução do endividamento, “elementos que permitiriam, em nossa opinião, um posicionamento da companhia em investimentos focados na diversificação das receitas em mercados promissores e voltados para a transição energética.”
Essa visão já vem sendo levantada por sindicatos de empregados da companhia e pelo Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), ligado à FUP (Federação Única dos Petroleiros).
E encontra eco no próprio conselho da estatal. Membro independente do colegiado, o advogado Francisco Petros diz que a estratégia da empresa não contempla uma visão integrada que considere necessidade de redução das emissões, satisfação dos usuários de energia e redução do custo de energia.
“Consideradas as variáveis estratégicas, o pagamento de dividendos no nível atual caracteriza a empresa ‘sem projeto'”, afirma. “Afora os excessos do controlador contra a governança da Petrobras, mesmo diante de um histórico já conhecido e penoso, agora temos a utilização dos dividendos como um meio de ajuste fiscal”.
A estratégia foi implantada na gestão Roberto Castello Branco, o primeiro presidente sob o governo Bolsonaro, que acelerou venda de ativos, ampliou o foco no pré-sal e aprovou a política atual de remuneração dos acionistas.
Retirou ainda a empresa de segmentos em que atuava havia tempo, como biocombustíveis, e novos negócios renováveis, como geração eólica, sob o argumento de que o caixa deve ser usado para investir no pré-sal.
Essa política prevê a distribuição de 60% da geração de caixa da companhia, descontados os gastos com investimentos, a cada trimestre em que a dívida bruta estiver abaixo de US$ 65 bilhões. Permite ainda a distribuição de dividendos extraordinários, como ocorreu neste segundo trimestre.
Para a FUP, a estratégia “reduz a capacidade de investimento da empresa e representa transferência de renda do trabalhador brasileiro em meio à escalada de reajustes dos combustíveis e da inflação provocadas pela equivocada política de preços”.
Nesta sexta-feira (29), o diretor de Finanças da companhia, Rodrigo Araújo, defendeu que a distribuição de dividendos é vista como “a melhor alocação de capital da companhia” e que não impacta na decisão de investimentos.
“Todos os investimentos que se mostram rentáveis no nosso cenário de preços foram aprovados”, afirmou ele. “A companhia não deixa de fazer investimentos para distribuir dividendos.”