Inflação nos EUA derruba mercados e faz dólar disparar


 
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Clayton Castelani / São Paulo, SP

Investidores de todo o mundo queriam ouvir na terça-feira (13) que o pior da tempestade no mercado financeiro havia passado, mas essa esperança se desmanchou após os Estados Unidos divulgarem ainda pela manhã que a inflação no país subiu 0,1% em agosto em relação a julho. No acumulado em 12 meses, a alta dos preços ficou em 8,3%.
Esperava-se amplamente que o CPI, sigla em inglês para índice de preços ao consumidor, mostrasse deflação. A agência Bloomberg projetava taxa negativa de 0,1% no mês e, no acumulado em 12 meses, apontava que o índice cairia de 8,5% para 8,1%.
A expectativa era que a principal economia do planeta estivesse se afastado um pouco mais rápido do pico inflacionário de 9,1%, atingido em junho, o maior em mais de quatro décadas.
Mercados de ações desabaram com a notícia. No principal deles, em Nova York, o indicador parâmetro S&P 500 desmoronou 4,32% e o Nasdaq, que concentra empresas que dependem mais de crédito barato para crescer, afundou 5,16%. O Dow Jones, que reúne 30 grandes empresas americanas, mergulhou 3,94%.

Os três índices tiveram o pior dia desde junho de 2020.

As ações da Meta, dona do Facebook, despencaram 9,37%. A Netflix perdeu 7,78%. A gestora BlackRock caiu 7,45%.
Remando contra a maré, o Twitter subiu 0,80% após investidores aprovarem a oferta de Elon Musk para comprar a rede social por US$ 44 bilhões.
A Bolsa de Valores brasileira caiu 2,30%, com o índice Ibovespa recuando aos 111.001 pontos. Petrobras e Vale, empresas com maior peso no mercado doméstico, cederam 2,94% e 2,71%, nessa ordem.
Só MRV Engenharia e BB Seguridade escaparam da baixa entre as mais 60 ações do Ibovespa. Elas subiram, respectivamente, 0,90% e 0,67%.
No câmbio do Brasil, o dólar saltou 1,80%, cotado a R$ 5,1890. Mais cedo, chegou perto dos R$ 5,21. A moeda americana também apresentou forte alta em relação às principais divisas.
Dado que melhor demonstra a persistência da alta de preços nos EUA, o núcleo da inflação de agosto, que exclui itens voláteis como alimentos e energia, subiu 0,6% e passou a acumular um avanço de 6,3% em relação aos 5,9% registrados em julho.
Os rumos da inflação americana são essenciais para a formação dos preços ao consumidor e dos juros também no Brasil. Isso vai além da pressão inflacionária exercida pela alta da taxa de câmbio sobre os valores de matérias-primas cotadas em dólar e das importações.
O custo do crédito no Brasil depende da taxa nos Estados Unidos, explica Ricardo Hammoud, professor de macroeconomia no Ibmec-SP. Para atrair e manter investimentos por aqui, o país precisa que seus títulos soberanos ofereçam juros suficientemente altos para compensar instabilidades políticas e econômicas.
Os juros americanos estão atualmente na casa dos 2,5%. No Brasil, a taxa básica Selic está em 13,75% ao ano. “A diferença [entre as taxas] é o risco brasileiro”, diz.
“Uma redução adicional do CPI nos EUA geraria a perspectiva de que, se esse ritmo fosse mantido, o Fed [Federal Reserve, o banco central americano] não precisaria continuar aumentando com rapidez os juros”, diz o economista Roberto Macedo, diretor acadêmico da Faculdade do Comércio de SP.
Aumentar juros é uma medida adotada por bancos centrais para segurar a inflação. O crédito mais caro reduz a circulação de dinheiro, e os preços tendem a cair. Um efeito colateral é o aumento do desemprego. Nos Estados Unidos, porém, há quase duas vagas abertas para cada pessoa à procura de trabalho.
Na próxima quarta-feira (21), o Fed deverá divulgar um novo aumento da sua taxa de juros. O mercado esperava uma elevação entre 0,50 e 0,75 ponto percentual.
Étore Sanchez, economista da Ativa Investimentos, considera que o dado desta terça sobre o CPI torna provável uma alta de 0,75 ponto na semana que vem.
Analistas da Nomura indicaram uma alta ainda mais agressiva, de 1 ponto percentual, na taxa do Fed em setembro. Em nota, indicaram que a sua previsão para a taxa terminal chegará a um intervalo de 4,50% a 4,75% até fevereiro de 2023.
Para Macedo, porém, o que importa para o Brasil neste momento é que investidores permaneçam com a expectativa de que os juros brasileiros continuarão dando um retorno muito superior aos dos EUA, sobretudo quando comparada a relação entre as taxas de crédito e de inflação dos dois países.
Este também é um momento em que investidores tendem a exigir um prêmio de risco maior do Brasil, uma vez que os principais candidatos à Presidência não demonstram planos concretos para controlar os gastos públicos.
Controlar despesas é a ajuda que o governo poderia dar para segurar a inflação e tornar o país mais atraente para investidores estrangeiros. “O problema é que nossos políticos estão deixando todo o trabalho para o Banco Central”, afirma Macedo.
Mercados de ações e de câmbio refletiam desde a semana passada a expectativa de investidores sobre uma possível queda da inflação nos Estados Unidos. Na prática, no Brasil e no mundo, o dólar estava caindo e os índices das Bolsas de Valores, subindo.
Daniel Miraglia, economista-chefe do Integral Group, olha esse movimento com cautela. Ele lembra que os mercados globais passaram por um período de forte baixa, e movimentos como os dos últimos dias são normais.
“O mercado tinha no CPI um pretexto para uma recuperação de preços de ativos que já estavam muito desvalorizados”, comentou.
Agora, com sinais de que a inflação segue forte nos Estados Unidos, investidores podem considerar que os juros por lá poderão ficar mais atrativos. Isso pressiona a alta global do dólar, uma vez que mais investidores tendem a retirar recursos de aplicações mais arriscadas para aproveitar o rendimento seguro dos títulos do Tesouro americano.
Diversas declarações recentes de membros do Fed já apontavam, porém, para um entusiasmo exagerado do mercado quanto à desaceleração da inflação e sobre a expectativa de desaperto dos juros nos EUA.
Na semana passada, Jerome Powell, presidente do Fed, disse que os Estados Unidos devem continuar a agir energicamente para reduzir a demanda e conter a pressão sobre os preços para evitar um pico de inflação como o observado nas décadas de 1970 e 1980.
A situação mencionada por Powell teve, há cerca de quatro décadas, graves efeitos globais. Na América do Sul, provocou uma crise da dívida pública.
Na época, a dívida do Brasil e de seus vizinhos era majoritariamente atrelada à moeda americana, cuja cotação internacional disparou.
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