Foto: Pablo VERA / AFP
Todo o espectro político do Chile, assim como familiares e apoiadores, despediu-se na sexta-feira (9) do ex-presidente Sebastián Piñera, destacado como um democrata aberto às diferenças por adversários como o presidente Gabriel Boric e a ex-presidente Michelle Bachelet.
A morte trágica de Piñera na terça-feira quando pilotava seu helicóptero no sul do país, comoveu o país, que vivia em paralelo o luta pelos megaincêndios em Valparaíso que deixaram 131 mortos.
Gabriel Boric, que fez parte da oposição ao governo Piñera durante seu primeiro e segundo mandato (2010-2014 e 2018-2022), contou que falou com o ex-presidente na segunda-feira para coordenar a ajuda mediante a catástrofe dos incêndios.
“Reconheço e valorizo que nunca se negou a prestar ajuda e conselho, apesar das diferenças públicas que tivemos no passado”, disse Boric na antiga sede do Congresso em Santiago, diante de todo seu gabinete e dirigentes de todo o leque político.
“Durante seu governo, as disputas e recriminações às vezes iam além do que era justo e razoável”, admitiu o presidente de 37 anos, que imediatamente decretou três dias de funerais de Estado ao saber da morte de Piñera.
Os gestos vindos do Executivo foram destacados pela viúva de Piñera, Cecilia Morel, e seus quatro filhos, que agradeceram a Boric com abraços afetuosos.
“Espero que esta homenagem sirva para que ressurja a unidade e a amizade cívica neste país”, disse Magdalena Piñera, em referência à divisão social e política que marcou o último governo de seu pai, após os protestos de outubro de 2019.
O presidente “socorrista”
Doze dos 33 mineiros do Atacama resgatados a 700 metros de profundidade em 2010, após 69 dias de manobras arriscadas, subiram ao púlpito da Catedral de Santiago, usando capacetes brancos, e exibiram uma bandeira chilena agradecendo ao ex-presidente por ter liderado aquela façanha.
“Hoje são 33 bandeiras e não 33 cruzes. Hoje, na Mina San José, essas 33 bandeiras estarão hasteadas ao lado de outra bandeira, que será a do nosso presidente, nosso salvador”, disse Luis Urzúa, um dos 33 mineiros, dirigindo-se a uma missa repleta de políticos e da família de Piñera.
León, neto mais velho de Piñera, deixou uma mensagem compartilhando aventuras a cavalo ou em lagos, como esses dias de férias interrompidos pelo acidente fatal: “Tenho orgulho de ter Sebastián como avô. Seu legado infinito está apenas começando”, disse o jovem “em nome dos seus 14 netos”.
Comoção da esquerda à direita
Com alguns de seus netos aos prantos, o caixão do ex-mandatário foi trasladado com honras militares até a catedral, antes de receber uma homenagem no Palácio Presidencial de La Moneda e ser enterrado no cemitério Parque del Recuerdo em Santiago em uma cerimônia privada.
Após os discursos do ex-presidente democrata-cristão Eduardo Frei (1994-2000), a socialista Michelle Bachelet (2006–10; 2014–18) ressaltou Piñera como o político que “tanto na ditadura como nas revoltas (sociais), escolheu a saída institucional para dar voz ao povo mediante o voto”.
“Ainda não posso fazer muitas reflexões porque o impacto é muito forte (…) mas tem sido muito emocionante ver todas as pessoas de todos os lugares do Chile”, disse Cecilia Morel.
Líderes de direita criticaram a “oposição dura e injusta” de Boric e membros do seu governo encarnaram quando lideraram a oposição a Piñera, que terminou seu mandato em março de 2022 com o pior nível de aprovação na história democrática do Chile.
De acordo com o Ministério Público, Piñera morreu na terça-feira de “asfixia por submersão” no Lago Ranco, onde seu helicóptero caiu a cerca de 920km ao sul de Santiago. Três passageiros saíram ilesos do acidente, entre eles a irmã do político.
O empresário era, aos 74 anos, um dos homens mais ricos do Chile, reconhecido por ter chegado ao poder em 2010 como o primeiro político de direita eleito democraticamente após a ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990).
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