Foto: Ricardo Stuckert / PR
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) criticou duramente o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, em entrevista coletiva neste sábado (6), em Londres, após a coroação do rei Charles 3º.
Sem mencionar o nome de Campos Neto nem uma vez, e se referindo a ele de novo como "cidadão", Lula disse que o presidente do Banco Central tem compromisso com o governo anterior, e não com o Brasil. Campos Neto foi nomeado à chefia do Banco Central por Jair Bolsonaro em 2019.
"Ele não tem nenhum compromisso comigo. Ele tem compromisso com quem? Com o Brasil? Não tem!", disse, demonstrando irritação. "Ele tem compromisso com o outro governo, que o indicou. Isso é importante ficar claro. Ele tem compromisso com aqueles que gostam de taxa de juros alta. Porque não há outra explicação. Não há outra explicação", repetiu.
"Outro dia, numa entrevista, ele disse ‘para eu atingir a meta [de crescimento] de 3%, a taxa de juro tem que ser acima de 20%’. Está louco? Esse cidadão não pode estar falando a verdade. Então, se eu como presidente não puder reclamar dos equívocos do Banco Central, quem vai reclamar? O presidente americano?", afirmou.
Procurado, Campos Neto disse que não comentaria as declarações do presidente.
As críticas acontecem três dias depois de o Banco Central decidir manter a Selic em 13,75% ao ano, sem sinalizar um corte futuro da taxa básica, conforme tem sido cobrado pelo presidente e outros integrantes do governo.
"Eu não discuto a autonomia do Banco Central", disse o presidente. Eu indiquei um presidente que era deputado federal eleito pelo PSDB. Eu nem conhecia o [Henrique] Meirelles quando eu indiquei ele [em 2003]. E eu duvido que esse cidadão tenha mais autonomia do que o Meirelles teve. Só que o Meirelles tinha a responsabilidade de ter um governo discutindo com ele, olhando as preocupações. Esse cidadão não tem."
Lula disse ainda que não bate no BC: "Desculpe, você nunca me viu bater no Banco Central", respondeu a um jornalista. "Eu não bato no Banco Central porque o Banco Central não é gente. É um banco. O que eu discordo é da política. Quem concorda com a política de juros de 13,75% que defenda publicamente. Eu não concordo."
"A sociedade, os varejistas, os empresários, os trabalhadores não suportam mais a taxa de juros. Se a gente quer gerar emprego no país, nós vamos ter que ter crédito. Crédito para o trabalhador, crédito consignado, crédito para as grandes empresas. Senão, o país não cresce. Estou tentando recolocar para o povo brasileiro, o país sadio, o país da esperança, o país da fé".
A conversa aconteceu no hotel em que ele e sua comitiva ficaram hospedados, ao lado do Hyde Park, nesses dois dias de visita ao Reino Unido. Lula acompanhou a coroação como um dos 2.200 convidados na Abadia de Westminster.
Lula afirmou também que pretende entrar com uma ação questionando a privatização da Eletrobras. Nesta sexta (5), o governo entrou com ação no STF para ampliar seu poder de voto na empresa, hoje limitado a 8% dos votos —a União tem 43% das ações.
Lula criticou limites criados na privatização da companhia que dificultam sua reestatização e questionou a remuneração de diretores e conselheiros da Eletrobras. "Os diretores aumentaram seus salários de R$ 60 mil por mês para mais de R$ 360 mil por mês, e um conselheiro para fazer uma reunião ganha mais de R$ 200 mil. Não é possível num país em que 33 milhões de pessoas passam forme vivermos numa situação como essa", afirmou.
No dia anterior, o brasileiro se reuniu com o primeiro-ministro britânico Rishi Sunak. "Ele assumiu a responsabilidade de contribuir com o Fundo da Amazônia. OS Estados Unidos vão dar US$ 500 milhões e agora a Inglaterra, que não sei quanto vai dar, mas espero que seja a mesma coisa", disse Lula. Diplomatas dos governos britânico e brasileiro, no entanto, informaram que a contribuição será de £ 80 milhões (R$ 500 milhões).
Por Ivan Finoti | Folhapress