Privacidade é colocada à prova em testes do real digital; entenda como a moeda vai funcionar

Por Nathalia Garcia | Folhapress

Foto: Agência Senado

A privacidade financeira dos usuários será colocada à prova nos primeiros testes da moeda digital brasileira -o real digital, em desenvolvimento pelo Banco Central. O objetivo é replicar nesse novo ambiente o mesmo grau de proteção aos clientes bancários exigido pela legislação, ou seja, garantir que transações só possam ser rastreadas pelas partes interessadas.
Nesta fase, também serão testadas as funcionalidades que darão ao cidadão a capacidade de controlar e programar o uso do seu dinheiro eletrônico. A ideia é que o uso da CBDC (Central Bank Digital Currency) brasileira seja tão simples quanto fazer um Pix, mas traga ganhos em transações mais complexas e hoje pouco acessíveis à população brasileira.
Em entrevista à Folha, Fabio Araujo, coordenador do real digital no BC, define a nova versão da moeda nacional como "uma plataforma para democratizar o acesso aos serviços financeiros no Brasil".
No futuro, o real digital abrirá a possibilidade de fazer, por exemplo, a compra de veículos atrelada a contratos inteligentes -documentos digitais programados por meio de tecnologia para serem executados de forma automática sob as condições acordadas.
Na prática, isso funciona de modo que o registro do carro em negociação seja transferido automaticamente para o comprador assim que o pagamento for efetivado por ele, e tudo ocorre simultaneamente.
Eliminar esse hiato no processo de compra e venda traz mais segurança para um acordo comercial entre pessoas desconhecidas. A lógica serve também para imóveis, produtos comercializados em plataformas eletrônicas, entre outros itens. Nos termos técnicos, esse tipo de negociação se chama DvP (entrega versus pagamento).
Hoje, as transações envolvendo contratos inteligentes não estão disponíveis em um ambiente regulado e necessitam de intermediários, o que torna o modelo economicamente inviável para negociações de itens de valor mais baixo. "Esse tipo de instrumento, que é muito caro e hoje só está acessível para algumas transações, poderá ser feito a um custo marginal", projeta Araujo.
O foco do projeto do real digital é levar serviço de varejo para toda a população. Ao longo das discussões sobre o tema, o BC concluiu que as pessoas não precisam ter o real digital "stricto sensu" em suas mãos para ter acesso a seus benefícios.
"Tem vários inconvenientes, de risco de desintermediação, de problemas macroeconômicos, que podem acontecer no ambiente onde há uma moeda do Banco Central direto na mão das pessoas", pondera o coordenador. Ele ressalta que hoje uma pequena parcela de papel-moeda circula na economia, enquanto a maioria das pessoas usa a "versão bancária" da moeda.
Para evitar uma mudança abrupta no sistema financeiro e assimetrias regulatórias entre os sistemas, a autoridade monetária atualizou as diretrizes da moeda digital e convencionou que o real digital ficará concentrado para atividades de atacado, ou seja, restrito a pagamentos entre o BC e instituições financeiras.
A população, por sua vez, terá acesso ao real chamado de tokenizado. Nesse caso, a representação da moeda brasileira será o token [representação digital de um ativo real] de um depósito mantido por instituições financeiras ou instituições de pagamento.
"Os bancos vão criar stablecoins [criptomoedas de baixa volatilidade, com lastro em ativos mais seguros] em cima dos depósitos. E as stablecoins vão ser garantidas pelo BC, um para um, em uma moeda digital", detalhou em setembro de 2022 Roberto Campos Neto, presidente da autoridade monetária.
"Então, você vai ter stablecoins dos bancos A, B e C. Todos são fundíveis, todos têm o mesmo valor e todos podem ser convertidos na moeda digital emitida pelo BC", complementou. (Continue lendo...)
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