Por Daniela Arcanjo | Folhapres
Foto: Reprodução/ Redes sociais
O assassinato de Fernando Villavicencio, candidato à Presidência do Equador, na quarta-feira (9), desencadeou uma onda de manifestações de políticos brasileiros de diferentes linhas ideológicas.
As deputadas federais Talíria Petrone (PSOL-RJ) e Maria do Rosário (PT-RS), por exemplo, foram às redes sociais lamentar a morte. As manifestações mais contundentes, porém, vieram de nomes da direita.
Até o final da manhã desta quinta (10), o deputado federal Mario Frias (PL-SP) já havia feito na plataforma X três posts sobre o caso —um deles inclui um vídeo, editado para inserir um logo do político brasileiro, em que Villavicencio diz que "com máfias não se faz acordos" e que na sua gestão a polícia atacaria primeiro.
O ex-secretário de Cultura no governo Bolsonaro também aproveitou para cobrar a mídia. "Pelo discurso já sabemos o motivo do assassinato! E a Globo tem a cara de pau de dizer que ele era de centro-esquerda."
Villavicencio, porém, traçou grande parte da sua trajetória na esquerda, ainda que, como ferrenho crítico do socialista Rafael Correa, tenha se aproximado do atual presidente do país, o direitista Guillermo Lasso.
Já o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho do ex-presidente, compartilhou uma publicação de María Fernanda Cabal, política colombiana favorável à liberação de armas para parte da população civil e a candidata mulher mais votada para o Senado nas eleições realizadas no ano passado no país.
Ao post, em que Cabal lamentou a morte do candidato que ela diz ser de direita, o deputado brasileiro acrescentou: "A democracia na América Latina, quase totalmente dominada pela esquerda, respira com a ajuda de aparelhos". Ainda que muitas nações da região tenham escolhido esquerdistas nos últimos anos, o Equador é um exemplo de país governado por um nome de direita, o já citado Lasso.
Eduardo publicou ainda um vídeo que juntou cortes do momento do assassinato de Villavicencio com entrevistas e discursos do candidato e termina com uma foto em preto e branco do político, com suas datas de nascimento e morte. Em seguida, fez uma lista de políticos presos ou investigados —incluindo seu pai, declarado inelegível em junho por oito anos—, sugerindo uma suposta perseguição à direita na América Latina. "Em comum: nenhum deles é de esquerda", afirmou o deputado.
Para o senador Magno Malta (PL-ES), a morte de Villavicencio "é mais um sinal para fazermos as escolhas certas enquanto ainda nos resta alguma". Ao compartilhar uma notícia de que a facção Los Lobos reivindica a autoria do assassinato, Malta afirmou que a região "está sendo dominada pelo narcotráfico".
No começo da tarde, o senador e ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, Sergio Moro (União Brasil), cobrou uma declaração do presidente Lula (PT) em relação ao assassinato. Junto à mensagem, compartilhou uma carta pública do Grupo Liberdade e Democracia, assinada por figuras da direita como Mauricio Macri, Sebastián Piñera e Iván Duque, ex-presidentes de Argentina, Chile e Colômbia, respectivamente.
"Ainda não ouvi uma palavra de Lula sobre o assassinato do candidato à Presidência do Equador, que era um defensor do combate à corrupção e da Lava Jato. Será que isso justifica o silêncio do presidente?"
Em nota divulgada na noite de quarta, dia do assassinato, o governo brasileiro, por meio do Itamaraty, manifestou "profunda consternação" diante da notícia da morte e classificou o ato de deplorável.
Além de figuras notórias da política brasileira, perfis de sátira ou de usuários comuns sugerem uma semelhança no discurso de Bolsonaro e Villavicencio e comparam a morte do candidato equatoriano à facada da qual o ex-presidente brasileiro foi vítima durante a sua campanha vencedora de 2018.
Uma das principais bandeiras do candidato equatoriano era a anticorrupção, e ele costumava criticar Lula nas redes sociais. "Foi só Lula ganhar para a Odebrecht abandonar um acordo de cooperação", afirmou ele em novembro do ano passado. Bolsonaro, porém, tampouco escapava de suas críticas. No final de 2018, ele compartilhou uma reportagem que mencionava as semelhanças entre o ex-presidente brasileiro e o líder venezuelano Hugo Chávez. Na mesma época, disse que ele não tinha nada a ver com Bolsonaro.
Para o professor do Departamento de Ciência Política da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
Jorge Chaloub, a reação de parte da direita era esperada, dada a natureza do evento.
"Há uma ideia comum na extrema direita e em certa direita que se radicalizou de que a esquerda é intrinsecamente criminosa, moralmente criminosa", afirma o pesquisador. "A gente vê essa tentativa de criar um pânico moral a partir dessa concepção de que políticos de esquerda não são rivais políticos, mas cidadãos moralmente depravados, criminosos, e a única solução é tirá-los do debate público."
Ainda segundo Chaloub, esse discurso aparece na associação de partidos de esquerda a facções como o PCC (Primeiro Comando da Capital) ou na sugestão de que a esquerda não quer combater o narcotráfico.
No caso de Eduardo Bolsonaro, o cientista político vê o deputado aproveitando a chance de se reafirmar como responsável pelos contatos internacionais da ultradireita no Brasil, além de reforçar a posição de liderança de seu pai na região. Na família Bolsonaro, ele costuma ser o elo com outras figuras de direita no mundo, como o premiê da Hungria, Viktor Orbán, ou o ex-estrategista de Trump Steve Bannon.
"Há uma eleição em breve na Argentina em que Javier Milei [candidato de ultradireita] é um nome forte. Já [José Antonio] Kast perdeu para Gabriel Boric no Chile, mas numa disputa apertada. Bolsonaro também vai querer ocupar esse espaço para não ser ultrapassado por outras lideranças", afirma Chaloub.