Por Ana Luiza Albuquerque e Mariana Zylberkan | Folhapress
Foto: José Cruz / EBC
Cresceu na quarta-feira (4) a animosidade entre o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e o influenciador Pablo Marçal (PRTB), candidato à Prefeitura de São Paulo.
Tarcísio, principal cabo eleitoral do prefeito Ricardo Nunes (MDB), há meses age para tentar estancar o crescimento do autodenominado ex-coach. Nesta quarta, o governador citou nominalmente o influenciador em depoimento exibido pela campanha do emedebista.
Na gravação, Tarcísio afirma que "Marçal é a porta de entrada para Boulos". Ele faz referência a pesquisa da Quaest que indica que Nunes teria um desempenho melhor que o influenciador num eventual segundo turno contra o candidato do PSOL. "Eu não quero que a esquerda ganhe. Eu não quero o Boulos", diz o governador.
Marçal reagiu e escalou o conflito quando questionado sobre a declaração de Tarcísio durante sabatina Folha/UOL, na manhã desta quarta. Ele afirmou que o governador enterra sua carreira política ao citá-lo para pedir votos ao aliado. "Sua decisão de tocar no meu nome é errada porque isso vai manchar sua carreira política."
O influenciador se referiu ao governador como uma "criatura feita pela transmissão de votos" do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e disse que Tarcísio terá "um problema [eleitoral] muito sério" em 2026 se continuar a atacá-lo. "Eu tenho representado essa frente do conservadorismo. Sou um representante forte aqui em São Paulo."
Marçal disse ainda que, se o presidente Lula (PT) morrer até 2026 e Bolsonaro estiver inelegível, ele se candidatará à Presidência. Tarcísio é tratado como o principal herdeiro do campo bolsonarista nas próximas eleições presidenciais, mantida a suspensão dos direitos políticos do ex-presidente. "Nem Tarcísio vai dar conta, porque apoiou o cara errado, Bolsonaro vai estar inelegível, e eu quero servir ao Brasil", afirmou o empresário.
O autodenominado ex-coach disse também que havia firmado um acordo de cessar-fogo com o governador. Segundo o UOL, Tarcísio recebeu Marçal na última quinta-feira (29) —um compromisso não divulgado em sua agenda. De acordo com a reportagem, o influenciador ofereceu parar de atacar o governador desde que também não fosse atacado, mas Tarcísio ficou em silêncio.
Na semana passada, o governador chegou a afirmar, em entrevista à Jovem Pan, que anular o voto em um eventual segundo turno entre Boulos e Marçal "seria um bom caminho". Tarcísio disse que o empresário não tem chance de fazer uma boa gestão e que não apresentou nada na campanha, "só lacração".
A afirmação gerou reações na direita bolsonarista, animada com o influenciador, e o vereador Carlos Bolsonaro (PL) criticou a fala publicamente. "Não existe voto nulo contra a esquerda", escreveu nas redes sociais. Tarcísio então recuou e disse que se expressou mal.
Principal fiador da campanha de Nunes, o governador afirmou a pessoas próximas ter sido aconselhado por Bolsonaro a tomar cuidado com a associação excessiva de sua imagem à do prefeito. O argumento do ex-presidente é de que, caso a campanha de Nunes afunde, Tarcísio poderia ser prejudicado.
Ainda assim, o governador já afirmou à imprensa que pretende cumprir mais agendas com o emedebista, que explora sua imagem na propaganda eleitoral.
Desde maio, quando Marçal anunciou que concorreria à prefeitura, Tarcísio tem sido o aliado de Nunes mais engajado na tentativa de estancar o crescimento do influenciador. Ele foi peça-chave, por exemplo, na costura que levou à vice do prefeito o ex-Rota Ricardo Mello Araújo (PL), indicação de Bolsonaro.
O raciocínio do governador, que defendeu que Nunes aceitasse a escolha, foi de que o movimento era necessário para amarrar o apoio do ex-presidente ao emedebista. A indicação, porém, não foi suficiente para convencer o eleitor bolsonarista de que Nunes é a melhor opção para a cidade.
Do fim de maio ao fim de agosto, Marçal passou de 7% para 21% nas intenções de voto, empatando tecnicamente na liderança com Boulos e Nunes, segundo pesquisas Datafolha. O influenciador disparou especialmente entre os eleitores de Bolsonaro, com 44%, frente a 30% do prefeito.
No meio de agosto, o ex-presidente chegou a elogiar Marçal em entrevista à Rádio 96 FM, de Natal, afirmando que ele "fala muito bem" e é "uma pessoa inteligente". Disse ainda que Nunes não é o "candidato dos sonhos", ainda que tenha assumido o compromisso de ajudá-lo.
Poucos dias depois, porém, Bolsonaro e seus filhos passaram a criticar o autodenominado ex-coach. Segundo uma pessoa próxima ao ex-presidente, Tarcísio, o presidente do PP, Ciro Nogueira, e o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, pediram que Bolsonaro ajustasse o discurso e reforçasse o apoio a Nunes.
Na mesma semana em que a família abriu fogo contra Marçal —o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL) pediu para que os eleitores tomassem cuidado e citou suspeitas que ligam o partido do influenciador à facção criminosa PCC— houve uma reunião em Brasília na qual o assunto voltou a ser mencionado.
O encontro foi promovido por Nogueira e contou com a presença de governadores de direita, entre eles Tarcísio, e caciques partidários como Valdemar e Antonio Rueda, presidente do União Brasil. Também estava lá o senador Flávio Bolsonaro (PL). Pessoas presentes na reunião afirmaram que Tarcísio e Rueda cobraram do filho do ex-presidente mais empenho da família pela reeleição de Nunes.
A família Bolsonaro, porém, surpreendeu-se com a forte reação nas redes sociais diante das críticas que faziam a Marçal. Eleitores escreveram que ainda assim votariam no influenciador, que tem defendido que a direita não tem dono, e que Nunes não é um bom representante das pautas do grupo. O ex-presidente e seus filhos então recuaram e Bolsonaro inclusive liberou a participação de Marçal no protesto marcado para o 7 de Setembro.
Tarcísio tem buscado alertar membros da direita, inclusive a família Bolsonaro, sobre o risco que o influenciador representa –alguém que, para o governador, se utiliza de um discurso fácil antissistema e de um esquema de distribuição de cortes de vídeos.
O governador já disse a aliados que tanto Marçal quanto Boulos representariam um mal para a cidade e prejudicariam as entregas conjuntas entre prefeitura e estado. O governador tem afirmado que a direita está mal orientada e deslumbrada com o empresário.