Fux diz que plataformas têm dever de monitorar crimes, e Barroso pede vista

Por Folhapress

Foto: Rosinei Coutinho/SCO/STF

O ministro Luiz Fux, do STF (Supremo Tribunal Federal), relator na corte de uma das ações que tratam da responsabilidade civil das plataformas, votou para ampliar as hipóteses em que as plataformas podem ser condenadas por conteúdos de seus usuários.
Fux relata uma das ações em debate na corte sobre o tema e o ministro Dias Toffoli, outra. A principal diferença entre elas é que a de Fux trata de um caso anterior à aprovação do Marco Civil da Internet, em 2014, enquanto a de Toffoli é posterior.
Na quarta-feira (11), Fux proferiu seu voto para os dois casos e defendeu que as redes devem ter obrigação de monitoramento ativo sobre conteúdos evidentemente ilícitos.
Ele fez a leitura de modo resumido, sem ler a íntegra do voto. Não ficou claro em que medida as fundamentações se aplicam apenas ao caso em que ele é relator e o quanto também valem para a ação relatada por Toffoli. O voto escrito ainda não foi liberado pela corte.
Segundo a votar, Fux acompanhou o ministro Toffoli, que tinha votado na semana passada pela inconstitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que prevê que as redes só podem ser condenadas a pagar indenizações por postagens de seus usuários após descumprir ordem judicial.
Atualmente, as únicas exceções previstas na lei são os casos de violação de direitos autorais e imagens de nudez não consentidas, em que bastam notificação extrajudicial.
Antes da conclusão do voto de Fux, o presidente da corte, Luís Roberto Barroso, pediu vista antecipada (mais tempo para análise) dos dois casos e disse que devolverá o tema ao plenário na próxima quarta (18). Pela ordem de votação, o presidente é o último a se manifestar. Com o pedido de vista, Barroso será o primeiro a falar na sessão de retomada.
Em seu voto, Toffoli propõe como nova regra geral que as plataformas passem a ser responsabilizadas a partir do momento em que forem notificadas. Ele cria, porém, exceções amplas e genéricas a essa diretriz, como conteúdo moderado ou recomendado pelas redes. Além disso, criou uma série de deveres extras para as plataformas, sobre os quais Fux não adentrou.
O clima no Supremo é favorável a estabelecer limites às redes, mas não deve haver consenso sobre uma eventual derrubada integral do artigo 19, como defendeu Toffoli. Além disso, o número de variáveis colocadas no debate deve dificultar a formação de maioria por uma tese sobre o assunto.
Fux defendeu que as plataformas podem ser responsabilizadas por conteúdos de terceiros nos casos em que tenham "ciência inequívoca do conhecimento dos atos ilícitos", seja por eles serem "evidentes" ou por serem "devidamente informados por qualquer meio idôneo", e não fizerem a remoção imediata do conteúdo.
O ministro disse que considera "evidentemente ilícito" o conteúdo que veicule "discurso de ódio, crime, racismo, mais explicitamente pedofilia, incitação à violência, apologia da abolição violenta do Estado democrático de Direito, e apologia a golpe de Estado". Ele acrescentou porém que a lista ainda está em aberto, porque ainda seria discutida com os demais ministros.
"Nessas hipóteses específicas, há para as empresas de provedor um dever de monitoramento ativo", disse.
Ele também defendeu que as empresas são responsáveis por todo conteúdo que tiver sido impulsionado, ou seja, em que há pagamento para que aquela postagem chegue a mais usuários daquele rede do que chegaria de modo orgânico.
"É presumido de modo absoluto o conhecimento da ilicitude por parte da empresa no caso de postagem onerosamente impulsionada", disse.
"Se queremos [sociedade] menos raivosa, temos que fazer alguma coisa sobre isso", disse o ministro, ao comentar a formação de bolhas na internet, em voto marcado por inúmeras críticas às redes.
O ministro defendeu que haja uma inversão em relação à dinâmica atual. Hoje, quando um usuário se sente ofendido ou lesado, precisa notificar a empresa e, em caso de negativa, acionar o Judiciário.
"Tem que inverter o ônus da judicialização. A partir de notificada, a remoção tem que ser imediata. Quer colocar de novo? Judicializa", disse.
O recurso analisado por Fux se refere a um caso movido por uma professora de Minas Gerais depois de ter sido alvo de ofensas em uma comunidade criada contra ela no extinto Orkut, do Google. Nessa ação, estava em questão, por exemplo, se as plataformas devem fiscalizar o conteúdo que nelas circula e ainda se elas devem remover conteúdo de suas redes mesmo sem decisão judicial.
Enquanto o caso em que Toffoli se pronunciou se refere a uma dona de casa do interior de São Paulo que pede indenização ao Facebook por causa de um perfil falso criado em seu nome. No centro do julgamento, está a constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet, que requer descumprimento de ordem judicial para responsabilização.
Aprovado no Congresso em 2014, esse modelo teve como intuito proteger a liberdade de expressão, ao não incentivar as empresas a remover conteúdos por receio de processos. Fux afirmou em seu voto que tal argumento seria uma falácia e que o objetivo inicial do que foi colocado à época da discussão do texto não foi cumprido.
A derrubada do artigo 19 para temas como crimes contra honra é um ponto criticado pela sociedade civil e pelas empresas.
Assim como Toffoli, Fux entende que, da forma como está o texto, as empresas recebem uma imunidade do Estado sobre o conteúdo que circula por meio delas e que há um déficit de proteção dos direitos fundamentais, argumentando que essa falta de proteção justifica a atuação do tribunal.
"O Supremo não é contramajoritário para dar as costas ao povo. Resta clara, a esta altura, a insuficiência constitucional do regime de responsabilidade do artigo 19 do Marco Civil", disse ele.
O ministro defendeu que a responsabilidade civil deve ter uma função predominantemente preventiva, ao contrário do cenário atual em que a reparação ao final seria um mero "prêmio de consolação".
Na quarta-feira (11), também Toffoli votou no caso relatado por Fux. Os demais ministros vão aguardar a devolução de vista de Barroso na próxima semana.
O ministro Alexandre de Moraes, que ainda não votou, chegou a defender ao longo do sessão que o tribunal deveria se posicionar também sobre inteligência artificial. O ministro Flávio Dino, por sua vez, se disse contrário, afirmando que o Congresso já está analisando o tema.
Depois do intervalo da sessão, o tribunal chamou para julgamento um processo que trata da suspensão de aplicativos de trocas de mensagens, como o WhatsApp, por decisão judicial, mas houve pedido de vista e o caso será retomado posteriomente.
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